A escola estava quase vazia desde há dias. No máximo uma meia dúzia de pessoas por ali andava de um lado para o outro com papéis, em frente aos computadores, a abrir e a fechar dossiers, a ultimar tarefas... Ele ia hoje começar de férias. Ia. Supostamente ia. Isto porque continuava a ir trabalhar. Quase não tinha tempo para comer (mas também o bar era constituído por vitrines vazias que espelhavam a mensagem "até para o ano". Nem para comer, nem sequer para apreciar um cigarro. Fumava ao mesmo tempo que escrevia, apontava, assinava, arrumava, arquivava. E assim seria ainda por mais uns dias. E não sabia se conseguia despachar-se de tudo. O mais certo era deixar algumas coisas para Setembro. Se não ficasse naquela escola, que sentia como sua há 10 anos, a ela voltaria nesse mês para terminar o que faltava. Estaria ao serviço noutra mas voltava. Não queria deixar trabalho para outro colega. A verdade é que hoje, oficialmente, começavam as suas férias mas ali estava. Faltava sempre qualquer coisa. Ia riscando o que já estava terminado mas faltava sempre qualquer coisa. Lá se ouvia alguém dizer: "Então boas férias, vou-me embora!" Eram cada vez menos ali de dia para dia. Mas não se importava muito com isso. Gostava dos colegas que ali restavam. Passavam grande parte do tempo a trabalhar mas num ambiente de paródia, a mandar bocas divertidas, a rir com tudo e mais alguma coisa. Era bom. Dava para desanuviar um pouco do stress.
Andava cansado, muito cansado. Sempre dormiu pouco. Sempre se deitou tarde. Aproveitava os fins-de-semana para se vingar e acordar à hora que entendesse. Nas férias, aí sim, dormia mais. Tarde se deitava, tarde se levantava. Mas agora ainda não estava de férias e, desde há dias, que se deitava muito, muito tarde. 5, 6 ou 7 da manhã ainda estava de pé, melhor dizendo, sentado ou deitado no sofá da sala. Conhecia bem o seu hábito. O hábito que noutras férias tinha criado. O de se deitar muito tarde, quase sempre com o nascer do sol. Este ano queria que fosse diferente. Queria aproveitar melhor os dias. Mas já estava a ver que assim não iria ser. Ainda não estava de férias, não se podia dar ao luxo de acordar às 2 da tarde e já se deitava depois das galinhas acordarem.
Lá para as 3 ou 4 da manhã, o gato vinha à sala 3 ou 4 vezes e ficava a olhar para ele como que indagando: "Então, não te vens deitar? Quero brincar com os teus pés e depois que me faças festinhas antes de dormirmos. Vá, anda lá!" E só já de dia, com barulho de carros na rua, lá ia ele até à cama. Este ano o hábito veio mais cedo, é um facto. Estava já no seu período de férias mas ainda ia trabalhar. E já se andava a deitar tão tarde. Os gatos já até adormeciam no sofá ou no tapete da sala 1 ou 2 horas antes dele resolver levantar-se. Ela, a moça de 4 patas, ali ficava a dormir profundamente toda a manhã. Ele, o moço de 4 patas, cheio de sono, mas sempre de olhos semicerrados, não muito acomodado ao seu próprio corpo, lá se deixava ficar à espera que o dono se levantasse e, dali a minutos, lhe desse as festinhas já na cama.
E muito poucas horas antes do despertador tocar lá ia ele em direcção ao quarto a pensar: "Amanhã vai ser diferente!" Mas sabia que não iria ser.
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3 comentários:
Há habitos que nunca perdemos n é?
Assim não aproveitas os dias. Vê lá se mudas isso.
Se assim te sentes bem, não vejo qual é o problema. Mas devias dormir mais horas, pelo menos isso.
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