E pronto, já estava a adivinhar aquilo. Não queria era pensar muito no assunto. Mas já supunha que aquele momento iria chegar.
Ali estava com as colegas de grupo, a conversar, quando ela se chega a uns dois metros e lhe faz sinal com o dedo. "Vem cá que eu quero falar contigo". Lá foi. Largou tudo e lá foi. A caminho da sala da chefia, ela, a que o chamou, é abordada por colegas com os problemas naturais desta altura do ano. Ele não estava para ficar ali à espera, aquilo não era nada consigo. Volta para a sala maior onde tinha assuntos a tratar com as suas colegas de grupo disciplinar.
Ela volta a chamá-lo. Lá vai. Queria falar com ele a sós.
Assim, de repente, com aqueles seus modos que ele conhecia já há uma década, lhe lançou a informação que ele já conhecia, acrescentando: "Não há outra hipótese!" Ela riu-se.
E pronto, em segundos, ele ficou a saber aquilo que já adivinhava e ali ouviu por palavras. Para o próximo ano lectivo, caso se conseguisse o esperado destacamento especial, ia ser Coordenador Pedagógico das turmas do Curso de Educação e Formação a funcionar na escola.
Nunca se importou de ser director de turma mas isso era muito diferente de ser coordenador pedagógico de uma turma de um curso daqueles. As férias estavam a começar e ele estava desejoso de largar o cargo de "boss" daquela turma epecial tão problemática. Alunos complicadíssimos com vidas familiares complicadíssimas, grandes dificuldades de aprendizagem, encarregados de educação despreocupados, faltas e mais faltas a ultrapassarem o limite permitido por lei, aulas grátis de compensação, dossiers, módulos, estágios, documentos atrás de documentos, tantas e tantas coisas ali perto de terminarem num espaço de dias e afinal... afinal para o ano ia ser bem pior. Ainda pior.
Criou-se um cargo novo e a quem o atribuíram? A ele. Ia ser o "Boss" dos outros "Bosses" dessas turmas. Ia ser o "Big Boss". "Uau! Fantástico! Que alegria!"
É comum aceitar-se que, subir na carreira, numa empresa, é óptimo. Tem-se mais resposabilidade, é-se "mais importante" e ganha-se mais financeiramente. Pois numa escola não é assim. O ordenado mantém-se, o escalão também e, dependendo dos cargos, o trabalho duplica, pelo menos em stress, preocupações e dores de cabeça. Seria o caso, claro. Ele já tinha a experiência de quatro anos como coordenador pedagógico de turmas de cursos de educação e formação profissional, mas havia sido uma turma por ano. E já era o que era. Nunca mais queria. Chegou-lhe!
Anos depois, a experiência de dois anos como coordenação pedagógica de uma turma de curso de educação e formação. Experiência agora a terminar, para seu alivio e felicidade. Mas agora ia ser diferente, pior. Ia ser uma coordenação de coordenações. Ia coordenar cordenadores dessas turmas. Se coordenar uma turma já era o que era. Se coordenar colegas já era o que era. Agora ia ser lindo. Coordenar duas turmas, dois coordenadores e o dobro dos colegas e alunos. Já para não falar de outros cargos que, na sua cabeça, andavam a tirintar. Já para não falar dos alunos surdos. Já para não falar das áreas curruculares não disciplinares, das parcerias e das restantes turmas. Essas sim eram as turmas que ele, efectivamente, queria ter e, para as quais, cada vez teria menos tempo. As turmas a quem leccionava a sua disciplina. Essas deviam ser o seu principal oblectivo, o seu grande foco.
Ele não queria ser cooordenador de nada, muito menos de algo assim. Não queria nada daquilo. Não queria ser "Boss", quanto mais "Big Boss". Ele queria simplesmente ser um "reles e simples" professor, um simples subalterno que lecciona a disciplina para a qual tirou um curso, que tem tempo de preparar aulas como gosta de o fazer. Um professor que gosta de ensinar os seus alunos.
"Irra, és tão novo e já tens cá um curriculo. Olha que é para muito poucos!" Disse-lhe uma colega toda muito divertida com aquilo. Ele queria lá saber do seu já tão completo e extenso currículo. Ele queria era saber dos alunos, de ser um bom professor, não de cargos e muito menos de cargos de acima de cargos.
"Se não gostasse tanto desta escola, destes colegas, deste ambiente... se a escola onde estou colocado não fosse tão longe, agora tão longe... ia para lá e não queria este destacamento especial. Ia ter umas oito ou dez turmas mas, ao menos era professor a tempo inteiro e livrava-me destas coisas que pouco têm a ver com a profissão que escolhi. Bem, paciência, para o ano logo se vê!" Pensou ele.
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5 comentários:
Vais ver que vai correr bem.
Conheço quem se queixe do mesmo e queira ser um reles professor. Mas parece que a ministra cada vez permite menos isso. E é triste.
Gente importante e competente é assim.
O ideal é ser um inútil porque assim nunca nos dão cargos nem nada para fazer.
Tu vais ser óptimo, certamente.
Xiiiiiiiiiii... ele faz isso tudo numa escola? Alunos surdos e tudo?
São as merdas que presidem a esta profissão ... mas que é que isso interessa? afinal os professores não fazem nada e têm imensas férias ... ninguém sequer repara que alguns professores fazem o trabalho de três ou quatro numa escola sem qualquer benefício acrescido por isso ... aqui se calhar também deveria imperar a sinceridade levada ao extremo, embora ninguém minimamente lúcido o faça claro, do género: " vá lá, não me sobrecarreguem de mais trabalho só porque normalmente aceito tudo pelo gosto da novidade profissional, eu que dou aqui o litro nesta escola, esses cargos podiam passar para o pessoal titular, alguns dos que andam a coçar as micoses e ganham mais que eu ... vá, fica assim, dão-me o destacamento que eu preciso, mas esse cargo muito chato de coordenador fica para outro ok?! e não se fala mais no assunto que não me quero chatear mais ... vá até logo ...adeus ó vai-te embora.
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