Maravilhas dos transportes públicos

Hoje, ia vomitanto com as náuseas sentidas perante o que vi. No comboio de regresso a casa, hoje mais cedo que o habitual, à minha frente sentou-se um homem pequenito e magro com um aspecto absolutamente asqueroso. Mas, acima de tudo, um homem com ar de quem já trabalhou muito no duro. Um homem triste, magoado com a vida. Um homem até com um olhar terno.
Pele velha e enrugada, roupa suja e mal cheirosa (hora de respirar pela boca), cabelo seboso com caspa, dentes podres (os poucos que lhe "minavam" a boca cicatrizada) e, pior, com a mão a sangrar. Olho e vejo uma mão de pele grossa e dura, escurecida do sol, com um bom bocado de pele arrancada, certamente, minutos antes. Eu nem estava a crer naquilo. E que fez o senhor para estancar o sangue? Tapou a carne viva com a pele pendurada e, qual penso perfeito e higiénico, apertou aquilo com um saco de plástico do Jumbo. Passou os cerca de 50 minutos da viagem a espreitar para o que se passava debaixo do saco já com sangue.
Uma ferida daquelas embrulhada num saco de plástico! Por muito que me tentasse abstrair não consegui. Tive de dizer qualquer coisa. "Desculpe... peço desculpa por estar a meter-me mas não devia ir ao hospital? Isso não está com muito bom aspecto e pode infectar. Não quer descer em Vila Franca? Eu vou consigo ao hospital. Fica a caminho da minha casa. Não me importo." E a resposta inesperado foi: "Isto tá bom, caralho. Na é nada e tu na tens nada a ver com isso, ouvistes? Olha-me este gajo. Foda-se!" Nem consegui responder. Puxei do ipod e escolhi "Loser" da Dolores o'Riordan. Achei apropriado.
E não é que o homem nunca mais saía do comboio? As estações iam passado e ele...nada de se levantar.
Ansiei chegar à minha saída e "livrar-me" do sujeitinho de quem tinha tido pena. Podia ter mudado de lugar, é certo, mas não quis, não fosse ele começar a "grunhir" qualquer coisa. Queria era livrar-me do homem e daquelas pessoas que olhavam de soslaio sem nada dizer. Livrar-me daquelas pessoas que ouviram aquilo e nada disseram. Continuaram a sua viagem como se nada fosse, como se ali nada se passasse.
Finalmente, Vila Franca, ia sair. Levanto-me e nisto, o homem levanta-se ao mesmo tempo. Por pouco aquela amalgama de carne, pele, sangue e plástico não me bateu na roupa. Seria o culminar do evento. Mas não, foi quase.
Dirijo-me para a porta com ele sempre à frente, muito lento a "arranjar o "penso" já em estado lastimável e indescritível.
As portas abrem-se, eu saio e a criatura o que faz? Vira-se para mim e sai-se com esta maravilha: "Oh pá, na me arranjas aí um cigarro, caralho?"
Aí passei-me. Apeteceu-me esquartejar-lhe a outra mão e partir-lhe as amostras de dentes negros daquela boca nojenta. Levantei a sobrancelha, olhei para ele com o ar, certamente, de maior repúdio que consegui e, como que em câmara lenta, abanei a cabeça em sinal negativo. "Não tens, caralho? Arranja aí!". "Tenho, está aqui". Saquei do maço que trazia no bolso e mostrei-lhe. "Tenho mas não dou!" Afastei-me daquela figura e não olhei para trás. Era o que faltava! Ele há gente!
Ai estas maravilhas dos transportes públicos...

8 comentários:

Anónimo disse...

Fizeste mto bem, eu passava-me mto mais do q isso. E é mm ridículo ninguém ter dito nada ao ver o homem assim e depois qdo te respondeu desta maneira.

Anónimo disse...

Grande estúpido esse sujeito.
Se calhar ninguém disse nada porque as pessoas já têm medo de ouvir respostas dessas, preferem manter-se no seu cantinho e fingir que nada se passa.

Hydrargirum disse...

É como diz o Rui....as pessoas já nada dizem pq sabem que vão decerto ter respostas assim...

Impressionante era-lhe mais importante o cigarro do que a mão naquele estado...!!!

Olha, perdi-lhe toda a compaixão!

Anónimo disse...

Deus meu, onde é que tu andas metido.
É por essas e por outras que eu já não me meto com ninguém nem para ajudar nem para nada.

Anónimo disse...

Não sei que comentar a respeito desta situação ... continuo a ter mais pena da pessoa em causa por ter sido tão estúpida e nem ter agradecido a atenção e humanidade que tiveste para com ele.Faz-me impressão qd as pessoas ignoram tudo à volta delas, como aconteceu com todos os outros que iam no mesmo transporte que tu, mas uma coisa é certa, parece que elas neste caso estavam correctas.
No fim arriscaste um pouco mas agiste bem, ele mereceu, mereceu mesmo ...

PS: Substitui já o "há" da terceira linha por "à" ... é daquelas distracções, mas convém o texto ficar sem nenhum erro

TheTalesMaker disse...

Pois, este foi um episódio, digamos, negativo, com que te deparaste. É comum nos transportes públicos. Mas também há os positivos, vais ver. Quem sabe se numa qualquer viagem ainda te deparas com o amor da tua vida, tipo filme romântico.

Anónimo disse...

Thetalesmaker...

quem te disse que o Graduated_fool não encontrou já o amor da sua vida?

Anónimo disse...

É preciso ter lata!!!
E há gajos que a têm. Gostava de ter visto a cara do homem depois da tua "nega".

Isso sim tinha sido digno de se ver (quando comparado com feriadas claro está).